sábado, 25 de janeiro de 2014

Trechos de diálogos: No sanatório.

    Um balão solto no ar deixou-se levar com o vento, elevando-se ao alto e distanciando-se da cidade abaixo, um simples e pequeno balão vermelho de borracha, cheio com gás hélio sobrevoou boa parte da cidade e no instante em que estava acima do sanatório chamou atenção de dois pacientes.
    Eles estavam sentados num banco do jardim e ao avistarem o invólucro vermelho pairando sobre os céus, logo começaram a apontar e comentar entre si.
    "Ah os balões", disse um deles, "tão cheios e coloridos, pendurados na parede sempre me lembram festa, inflados com o ar dos pulmões; balões me lembram infância e aniversários, balões me lembram do estrondo que fazem ao estourar e de como os garotos mais treteiros, vinham sempre com um palitinho em mãos, praticamente escondido entre os vãos dos dedos, prontos para acabar com a felicidade de qualquer criancinha menor".
    "Não quero tirar seu sorriso dos lábios meu caro amigo", respondeu o outro com certo ar de superioridade, "mas suas palavras me fizeram refletir sobre a vida".
    "Sobre a vida?" Demonstrou espanto.
    "Sim sobre a vida", afirmou com serenidade e completou, "sobre o homem".
    "Como assim?" Ainda estava atônito, porém seu amigo respondeu calmamente, com ar pedagogo.
    "Os homens são como os balões; uns tem por cor o azul, outros o vermelho, nós crescemos e não obstante, queremos nos inflar com o ar alheio e exibir nossas cores e opiniões; o pior é que nos esquecemos".
    "De quê? Não, eu já sei", e tornou a rir quase triunfante, "nos esquecemos de que quanto mais a gente infla, mais próximo está de estourar!"
    "Você tem uma boa linha de raciocínio meu caro, parece que está mesmo entendendo o que estou falando", tornou a dizer com paciência, "mas não é ai que eu quero chegar".
    "Então quer chegar aonde?"
    "Ao palito"
    " O quê?" disse o que já estava quase perdendo de vez os sentidos.
    "Ao palito, aquele que vem na mão do moleque treteiro, escondido entre os vãos dos dedos, sorrateiro; basta um toque seu e o mais belo balão na mão da mais bela criança se vai, e seu estrondo a faz chorar, sua desintegração também, torna-se um pedaço de borracha velho, sem cor e sem credo."
    "Que analogia maravilhosa!"
    "Ora também não é para tanto, vi isso em suas palavras. A que horas vão servir o chá?"

    Carlos Eduardo Taveira.