quarta-feira, 20 de maio de 2015

Mágoas em águas inebriadas

   As aparências entregam, desculpe-me expor desta forma, contestando um paradigma de senso comum, contudo, para olhares mais atentos e certas características evidentes a sentença se faz correta, ainda que à mercê de equívocos, detalhes podem sempre surpreender; mas veja, por exemplo:
   Aquele sujeito no balcão, conversando com o garçom como fossem amigos de longa data, sentado no banco, com alguma elegância embora embriagado, curvado sobre o balcão e apoiado nos cotovelos. Veja seu sorriso débil e seu olhar com brilho de angústia, repare como as mangas arregaçadas de sua camisa evidenciam seu relógio caro, ao qual ele não pousa o olhar há algum tempo, afrouxou a gravata e deixou de lado o terno, toma um cowboy duplo, sem gelo, a dose é cara e não é a primeira.
   Ele mira toda mulher que passa, repara sem dissimular a expressão do rancor e do desejo que sente, e cada vez que volta o olhar ao copo, traga de seu uísque, um gole grande que desce rasgando a garganta, mas que não o invade como gostaria, como uma onda que se erige acima das outras, transpõe a orla e invade as casas levando tudo que um dia foi sólido para o abismo do intestino de um deus desconhecido, ele já sofreu esse abalo, entretanto a onda que destruiu sua casa deixou destroços que nem mil goles podem levar.